UNO Agosto 2013

O retorno de tecnocratas ou o triunfo da razão

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O primeiro presidente da CEOE, Carlos Ferrer Salat, comentou comigo, há muitos anos, que o segredo de um bom governo não está em ser dirigido por tecnocratas ou políticos, o importante é que o vento da História sopre a seu favor. “Se é claro para o governante o rumo que deve seguir, irá superar os imprevistos e as dificuldades com os quais, sem dúvidas, irá deparar-se no exercício de suas responsabilidades, mas se for conforme a corrente, ela terminará levando-o ao seu destino”.

Em uma situação como a atual, o debate não se concentra tanto em escolher entre a despolitização ou a tecnocracia, mas sim em encontrar o rumo. Durante estes 36 anos de democracia, a Espanha sofreu cinco recessões e saiu de todas elas. Isso porque tínhamos um objetivo definido: ser uma democracia, fazer parte da Europa, estar no euro, e conseguimos isso.

O segredo de um bom governo não está em ser dirigido por tecnocratas ou políticos, o importante é que vento da História sopre a seu favor e a corrente simplesmente o levará a um bom porto

Agora, o novo projeto coletivo é fazer parte do grupo de lideranças que irá impulsionar a criação dos Estados Unidos da Europa. Uma meta difícil, que nos obriga a superar a Grande Recessão. Para conseguir essa superação, o presidente nomeou alguns ministros com reconhecida solvência técnica, como o ministro da Economia, Luis de Guindos, ou o da Fazenda, Cristóbal Montoro. Estes, por sua vez, se cercaram de pessoas muito bem preparadas que poderiam ser chamadas de “técnicos”. Isso significa o retrocesso ao governo de tecnocratas nomeado pelo General Franco para que administrasse o Plano de Estabilização de 1959? Acho que não. Ninguém pode questionar a nova equipe de governo sobre sua legitimidade e representatividade, embora alguns dos seus membros não tenham concorrido nas eleições nem sejam militantes de qualquer partido político. Todos eles foram designados por um Presidente que representa a vontade popular. Pelo contrário, o chamado governo dos “lopeces” –López Bravo, López de Letona, López Rodó– não tinha essa legitimidade democrática porque tinha sido nomeado por um ditador, cujo poder se baseava em ter vencido a Guerra Civil.

05Mas, com certeza, existe certo paralelismo. Agora, assim como naquela época, a Espanha se encontra em uma situação crítica, prestes a sofrer intervenção do FMI para evitar uma suspensão de pagamentos. Isto faz com que nós dependamos do financiamento externo para ir em frente. Para obter os créditos de que precisamos, os credores nos exigem garantias que lhes assegurem que vamos devolver-lhes o dinheiro, com os juros correspondentes. É por isso que impõem uma desvalorização interna, que consiste em uma drástica contenção de despesas que nos permita ganhar competitividade para vender ao exterior os nossos produtos e serviços. Somente assim poderemos obter o dinheiro de que precisamos para pagar as nossas elevadas dívidas. Isso implica enormes sacrifícios para os cidadãos, e os políticos resistem em tomar essas decisões porque temem que a fúria de seus eleitores acabe politicamente com eles.

Franco, quando teve a corda no pescoço, contratou um grupo de “tecnocratas” (literalmente “governo dos técnicos”) para que articulassem um Plano de Estabilização Econômica que nos tirasse da crise. Entre eles estavam Alberto Ullastres (Comércio), Mariano Navarro Rubio (Fazenda) e Laureano López Rodó como chefe da Secretaria Geral Técnica da Presidência. Eles, por sua vez, contrataram uma série de economistas de doutrina liberal e democrática para que elaborassem as medidas. Faziam parte daquele grupo Joan Sardá i Dexeus, Enrique Fuentes Quintana ou Fabián Estapé. Todos eles amparados pelo Almirante Luis Carrero Blanco, que era absolutamente consciente de que a Espanha não tinha outro caminho que fazer parte da Europa. Por isso convenceu o general Franco a pedir formalmente ao presidente da CEE que começasse as negociações para vincular a Espanha ao mercado comum.

O novo projeto coletivo é fazer parte do grupo de lideranças que irá impulsionar a criação dos Estados Unidos da Europa

Aquele Plano supunha terminar com a autarquia. Não é verdade que os mercados trouxeram a democracia e o livre mercado à Espanha, nem que Franco quisesse por fim ao que considerava uma parte essencial do seu Regime, ele não tinha outra saída. O caixa estava vazio. De fato, ele mesmo e os falangistas se opuseram com unhas e dentes à aplicação do Plano, e conseguiram atrasá-lo um tempo, mas, finalmente o bom senso se impôs. O vento da história não soprava no sentido do isolamento. Os mercados financeiros sabiam que a única forma de recuperar os seus empréstimos era que a Espanha se aproximasse da Europa. Este foi o motivo, e não outro, pelo qual o Generalíssimo terminou nomeando um governo de “tecnocratas”, não porque estivessem vinculados ao Opus Dei, mas sim porque tecnicamente eram os melhores e os que mais confiança dariam aos mercados para que continuassem emprestando dinheiro para a Espanha. É isso o que acontece agora. Para ganhar novamente a confiança dos investidores, é necessário ter gestores, mais do que ideólogos.

Significa que os “técnicos” não são políticos? De modo algum, os políticos são os que sabem qual o rumo a seguir.

Mariano Guindal
Jornalista econômico
Reconhecido como um dos jornalistas econômicos mais reconhecidos na Espanha, colabora nos programas como “Kilómetro 0”, da Telemadrid e “Capital”, da Rádio Intereconomía. Guindal também é colunista do The Economist. A maior parte de sua longa trajetória profissional foi escrita no La Vanguardia, onde foi editor-chefe e colunista. É autor do livro “O declínio dos deuses”, que se transformou em um livro de referência no mercado.

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