UNO Agosto 2013

Quando a geografia não é tudo

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Em 2017, a participação relativa da China no PIB mundial será superior ao dos EUA, segundo previsões recentes do FMI. Os dados frios indicam que esse ano terá 18,6% contra 17,7% dos EUA, 7,1% da Índia e 5% do Japão. Um trabalho recente do BBVA segue a mesma linha e indica que nos próximos 10 anos a contribuição da Ásia emergente ao crescimento mundial será de 58% (A China somente 30%).

Com base em estudos semelhantes, fala-se do deslocamento dos centros de poder mundiais ao Ásia-pacífico, ou em um maior protagonismo asiático, especialmente chinês, aliado a uma nova ordem multipolar. Graças a esses movimentos, a América Latina, que chegou a taxas elevadas na última década, principalmente devido à demanda asiática, poderia ocupar um lugar central ou de destaque no cenário mundial.

Carlos Álvarez, secretário geral da ALADI, afirma que “a presença cada vez mais protagonista da China, a decadência dos EUA, a crise estrutural da Europa e a emergência do Sul como locomotora da economia mundial”, fizeram com que a América Latina não somente seja “o continente da esperança”, como também seja “uma realidade potente que pode aspirar a ser um dos personagens principais na nova reconfiguração mundial em andamento”.

Os últimos esforços na integração regional, com iniciativas como Unasur ou a CELAC, estão concentrados em questões políticas que dependem basicamente da capacidade de diálogo presidencial

A América Latina está situada estrategicamente entre o Atlântico e o Pacífico. Se no século XIX e começo do XX foi beneficiada com o impulso das economias atlânticas, hoje acontece o mesmo com as asiáticas. No entanto, a geografia não é tudo, já que pode ser tanto uma benção como o pior pesadelo. Por isso, se a América Latina quer ocupar um lugar central no mundo, deve ser por seu esforço e dedicação, já que com o voluntarismo não é suficiente. É bastante sintomático que o mesmo relatório do BBVA diga que a contribuição regional ao crescimento internacional, incluindo Brasil e México, será de somente 7,8%. Claro que é bastante, mas não o suficiente para desempenhar um papel chave no mundo de amanhã.

12Há pouco tempo Roberto Russel definia a América Latina como um continente fragmentado. Não se trata unicamente da realidade política e das diferenças entre bolivarianos e não bolivarianos. A economia também responde a realidades muito diversas, como reflete o desempenho de grande parte dos países sul-americanos em comparação com os da América Central e México, ou inclusive com o Caribe. Portanto, é cada vez mais difícil falar sobre a América Latina, especialmente com fins prospectivos.

Os últimos esforços na integração regional, com iniciativas como Unasur ou a CELAC, estão concentrados em questões políticas que dependem basicamente da capacidade de diálogo presidencial. Isso supõe pequenos progressos institucionais, em espacial na cessão de cotas de soberania a organismos supranacionais. Ao mesmo tempo, esse processo cumulativo, em uma espécie de permanente corrida ao futuro, não resolveu o quê fazer com as instâncias previamente existentes. O caso mais emblemático é a fusão da Unasul com o Mercosul e a Comunidade Andina (CAN).

A constituição da Aliança do Pacífico pelo Chile, Colômbia, México e Peru caminha em uma direção diferente. Em primeiro lugar porque transcende a discussão de se a integração deve atingir a América do Sul ou a América Latina, e em segundo lugar porque até então não inclui o Brasil. Seu propósito claro é aproveitar sua renda de localização e sua maior proximidade aos mercados asiáticos em uma difícil conjuntura internacional.

Mas, para isso, é necessário que os países envolvidos caminhem na mesma direção. Que resolvam em breve seus importantes déficits em infraestruturas, potencializem o investimento em I+D+i, melhorem a qualidade de suas universidade (os centro-asiáticos estão muito melhor posicionados que os latino-americanos nos rankings universitários internacionais) e concretizem as reformas necessárias para consolidar seu processo de crescimento, fugindo da chamada “armadilha da renda média”.

A consolidação da emergência dos países asiáticos pode ser uma grande oportunidade para a América Latina

Sem tais reformas podem estar no limbo do crescimento moderado, mas sem dar os passos necessários para jogar na primeira divisão. México é um caso interessante, como mostra o estudo do Centennial Group: “A New Vision for Mexico 2042: Achieving Prosperity for All”.

A consolidação da emergência dos países asiáticos pode ser uma grande oportunidade para a América Latina. Mas as oportunidades ou são aproveitadas ou são perdidas, como a Argentina volta a mostrar. Para poder tirar proveito delas, deve ser realizado um intenso esforço, longe dos atalhos populistas. Simultaneamente, é preciso estar atentos a uma evolução diferente da economia chinesa, muito dependente dos seus complicados equilíbrios internos. Não convém colocar todos os ovos na mesma cesta, sabendo que a América Latina continua fazendo parte do Ocidente, uma grande vantagem que não vale à pena perder gratuitamente seduzidos pelo grande sonho oriental.

Carlos Malamud
Professor Titular de História da América da UNED
Professor Titular de História da América na Universidade Nacional de Educação a Distância (UNED) e Pesquisador Principal para a América Latina do Real Instituto Elcano. Foi pesquisador convidado no Saint Antony’s College (Universidade de Oxford), na Universidad de los Andes e na Universidad Di Tella, de Buenos Aires. Membro do Conselho Assessor do Instituto de Cultura da Fundação MAPFRE. Escreveu numerosos livros e artigos de história e atualidade latino-americanas, como por exemplo: Populismos latinoamericanos. Los tópicos de ayer, de hoy y de siempre (Populismos latino-americano. Os tópicos de ontem, de home e sempre, em tradução livre) Ed. Nobel, Oviedo, 2010; Historia de América, Alianza, Madrid, 2010. @CarlosMalamud

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