UNO Julho 2017

Três avaliações diferentes sobre Trump

Trump completa cem dias no poder com três visões diferentes em relação ao balanço: a crítica, a moderada e a positiva. Iniciando pela mais extrema delas, pode ser considerado um presidente que fracassou. Começando pela economia, esta cresceu apenas 0,7% no primeiro trimestre, percentual bem abaixo do que é necessário para que, em seu primeiro ano de gestão, o crescimento fique entre 3% e 4%. Fracassou no Congresso, ao não alcançar a aprovação de sua reforma chave, a do Obamacare. Ao mesmo tempo, no projeto do orçamento, este se viu forçado a aceitar que não se incluíram pontos para a construção do muro com o México, um dos objetivos imediatos mais proclamados. Desde o surgimento de medições sistemáticas, a partir da presidência de Eisenhower, é o presidente com o mais baixo nível de aprovação (43%) a cumprir cem dias de governo. As mobilizações contrárias a ele continuam, como a realizada no dia 1o de maio, na capital do país. A Justiça, em primeira e segunda instâncias, freou seus decretos para limitar a imigração proveniente de países muçulmanos. As denúncias sobre sua vinculação com a administração de Putin enfraqueceram sua credibilidade e o ameaçam. Na política externa, tem tido altos e baixos e deixou claro que não tem uma estratégia definida. Iria aliar-se a Putin e terminou derrotado pelo bombardeio da Síria; ia enfrentar a China e acabou buscando uma aproximação pela crise da Coreia do Norte. Sobre o Acordo Norte-Americano de Livre Comércio (NAFTA, na sigla em inglês), anunciou que o abandoaria e, em seguida, que o havia renegociado. O exercício “familiar” do poder envolve a instalação da “cultura populista” na Casa Branca.

 

Pela visão favorável sobre o saldo dos cem dias de Trump, a opinião é totalmente o contrário. Quanto a ter 43% de aprovação, significa dizer que mantém intacto o apoio de seus eleitores, apesar das ferozes críticas dos meios de comunicação. Os valores recordes registrados por Wall Street, Nasdaq e o índice de títulos da JP Morgan, alcançados durante os primeiros cem dias de Trump, são uma eloquente evidência de que este tem as expectativas econômicas a seu favor. Lançou uma ambiciosa reforma tributária, reduzindo impostos sobre empresas e a classe média antes de completar os cem dias, cumprindo sua promessa mais importante no campo econômico. Postos de trabalho vêm sendo criados, o desemprego está diminuindo e os investimentos estão voltando. No Congresso, o único problema a ser resolvido são os 33 representantes da “Freedom House“, ou seja, da ala direita de seu partido – aproximadamente 12% da bancada republicana na Câmara Baixa – que coincidem com a linha estratégica do presidente, mas que exigem medidas mais duras. Quase que a totalidade de seus compromissos no Executivo foram aprovados pelo Senado. Com a aprovação de seu candidato pela Suprema Corte, passou a ter maioria – 5 a 4 –, o que poderia aumentar a margem a seu favor nos próximos meses, com a qual poderia reverter as decisões judiciais adversas da primeira e segunda instâncias. Embora seja verdade que a dotação orçamentária não contemple uma parcela para a construção do muro com o México, o Congresso aprovou um aumento de 10% no orçamento da defesa, um objetivo muito mais importante e um montante muito maior. Trump demonstrou, com o uso do Twitter e das redes sociais, que pode enfrentar os meios de comunicação que, majoritariamente, o criticam. Mostrou firmeza na política externa, diante do bombardeio na Síria, com o uso da “mãe de todas as bombas” no Afeganistão, e se encaminha para resolver o risco que a Coreia do Norte representa, para o bem ou para o mal.

 

O fato de ele apresentar a taxa de aprovação de 43% significa que ele continua contando com o mesmo apoio dos seus eleitores, apesar das críticas intensas na mídia.

 

Em meio às duas interpretações, há aqueles que sustentam que Trump começou a enfrentar os limites do sistema e que, de uma forma ou outra, vai se adequando a ele. A Justiça de primeira e segunda instâncias, ao rejeitar os decretos sobre a imigração de países muçulmanos, limitou o uso dos decretos e ele o aceitou. O mesmo aconteceu com o Congresso ao rejeitar o projeto do Obamacare e o muro com o México, e o presidente teve de aceitá-los como outro limite do poder. Significa dizer que a divisão de poderes está funcionando e limitando a arbitrariedade de Trump. Que o Congresso possa se opor à reforma tributária pode diminuir as expectativas econômicas, mas ao mesmo tempo confirmaria que a limitação ao poder é real e concreta. Na política externa, as mudanças relacionadas à Rússia e à China mostram que, ao final, o realismo e o uso do poder militar se impõem dentro dos limites razoáveis. As medidas protecionistas, afinal, foram inferiores àquelas anunciadas. Em suma, a imprevisibilidade de Trump tem sido menor do que a esperada pela efetividade do sistema, que tem limitado suas decisões.

 

Enquanto isso, as eleições europeias mostram um freio relacionado ao populismo, mas, ao mesmo tempo, um aprofundamento da crise das estruturas partidárias. O segundo turno da eleição presidencial francesa, vencida por Macron, mostrou, entre outras coisas, que os dois partidos tradicionais ficaram de fora do segundo turno – é uma crise sem precedentes do sistema político em mais de meio século. Isso levanta dúvidas sobre a governabilidade emergente das eleições legislativas a serem realizadas nos dias 11 e 18 de junho (segundo turno). Esta crise de sistemas políticos foi colocada em evidência no referendo italiano, nas eleições presidenciais austríacas e na eleição geral holandesa, embora nas últimas duas o populismo, finalmente, não tenha ganhado. Ao contrário, no Reino Unido, a primeira-ministra (Theresa May) pode obter uma vitória histórica nas eleições gerais de 8 de junho, ao conseguir para seu partido cerca de 50% dos votos e aproximar-se dos dois terços do Parlamento, o que reforça sua decisão em favor de uma versão “dura” do Brexit. Fora do Ocidente, o referendo turco fortaleceu Erdogan, que em maio visitará Putin, Xi e Trump, reforçando seu papel de potência regional no Oriente Médio. Em 9 de maio foram realizadas eleições presidenciais antecipadas na Coreia do Sul entre dois candidatos, sob a ameaça de um conflito nuclear. Um candidato assume, sem limitações, a aliança militar com os EUA, e o outro inclina-se a uma posição mais pacifista. Em 19 de maio aconteceram as eleições gerais no Irã e o presidente Rohani tentará sua reeleição. A divisão dos conservadores pode favorecê-lo, assim como a economia pode complica-lo.

 

Enquanto isso, as eleições europeias mostram uma certa desaceleração do populismo, mas ao mesmo tempo uma crise maior das estruturas partidárias.

 

Em suma, a visão crítica de Trump cumpre cem dias com o mínimo de aprovação em 60 anos até agora, com a economia crescendo pouco, entre idas e vindas na política externa e sem alcançar os seus objetivos; na visão favorável, não perdeu eleitores, conseguiu controlar a Suprema Corte, pode solucionar as objeções da ala direita no Congresso e segue firme e efetivo na política externa; na visão intermediária, o presidente passou a aceitar os limites impostos pelo Congresso e pela Justiça, adotando uma linha pragmática na política externa, ou seja, apontando que o sistema está funcionando. Ao mesmo tempo, na França se evita o pior cenário e fora do Ocidente, Erdogan se fortalece vencendo o referendo. As eleições antecipadas na Coreia do Sul estão sob ameaça de um conflito nuclear e Rohani pode ser reeleito no Irã.

Rosendo María Fraga
Diretor do Centro de Estudos Nova Maioria,
E advogado graduado pela Universidade Católica Argentina. Também atua como analista político, jornalista e historiador. É membro da Academia Argentina de História, da Academia Nacional de Ciências Morais e Políticas, do Conselho Argentino de Relações Internacionais (CARI), do Instituto de História Militar da Argentina. Ganhou o Prêmio Konex em Comunicação Jornalística (1997) e o Prêmio de Santa Clara de Assis (2005). Publicou 43 livros sobre temas históricos, políticos, militares e regionais. Foi condecorado pelos governos do Brasil, Chile, Espanha e Itália. É diretor do Centro de Estudos Nova Maioria e do site www.nuevamayoria.com [Argentina]

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